domingo, 12 de agosto de 2012

As lições de Londres-2012 para a sustentabilidade em Jogos Olímpicos

Um dos principais legados de Londres-2012 é o avanço na aplicação dos conceitos de sustentabilidade, em relação às últimas Olimpíadas. Ficaram importantes lições, que já poderão ser aplicadas nos Jogos Olímpicos e Paraolimpíadas do Rio de Janeiro em 2016 mas que também valem para os dois outros megaeventos no Brasil, a Copa das Confederações, em 2013, e a Copa do Mundo de Futebol, em 2014.
A vinculação entre esporte e meio ambiente começou com força dois anos depois da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, a Rio-92, no Rio de Janeiro. Em 1994, o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) assinou acordo de cooperação com o Comitê Olímpico Internacional (COI), que neste mesmo ano incluiu o meio ambiente como o terceiro pilar do movimento olímpico, ao lado do esporte e da cultura.
Em outubro de 1999, na Terceira Conferência Mundial sobre Esporte e Meio Ambiente, realizada no Rio de Janeiro, foi lançada a Agenda 21 do Movimento Olímpico Esporte para o Desenvolvimento Sustentável. Medidas concretas relacionadas à sustentabilidade passaram a ser tomadas a partir dos Jogos Olímpicos de Sidney, na Austrália, em 2000. (Ver mais sobre História da relação Esporte e Sustentabilidade na coluna História: http://esporteesustentabilidadenobrasil.blogspot.com.br/p/historia.html)
O projeto de Londres 2012 - Desde a concepção da candidatura, Londres considerou a possível realização dos Jogos Olímpicos como uma excelente oportunidade para estimular a economia local, gerando renda e emprego, a partir da transformação da área mais degradada da cidade, na região Leste, a East London. E a reconstrução deveria seguir princípios da sustentabilidade, segundo os responsáveis pela candidatura.
Uma das medidas tomadas para garantir esse legado de sustentabilidade foi a criação da Comissão para uma Londres-2012 Sustentável, que atuaria no monitoramento das medidas tomadas, com a postura de ser um "amigo crítico". Comentários temáticos e relatórios sobre vários aspectos foram produzidos pela Comissão, cujo mandato expira no início de 2013, após um amplo balanço do que aconteceu de fato em termos de sustentabilidade relacionado aos Jogos Olímpicos e Paraolimpíadas.
Quando Londres se candidatou a sediar os Jogos de 2012, a cidade já havia se comprometido a criar um órgão para o controle independente da sustentabilidade. A Comissão foi então criada em 2007. Um conjunto de 233 recomendações foi feito pela Comissão, que passou a acompanhá-las e a divulgar trimestralmente o status de sua aplicação pelo comitê organizador dos Jogos Olímpicos.
No último balanço trimestral, divulgado um mês antes do início dos Jogos de Londres, a Comissão considerou que tinham sido consideradas satisfeitas 155 recomendações até aquele momento. Foram recomendações relacionadas ao planejamento e execução de medidas concretas para garantir o legado de sustentabilidade dos Jogos Olímpicos, em torno dos cinco eixos principais do Plano de Sustentabilidade Londres-2012: Mudanças Climáticas, Resíduos, Biodiversidade, Inclusão e Vida Saudável. A Comissão considerou nesse levantamento que em relação a outras 46 recomendações haviam sido observados progressos.
Entre as recomendações satisfeitas, estava aquela que, para a Comissão, seria chave para que o Plano de Sustentabilidade fosse executado da melhor forma possível. Era a recomendação de as várias organizações governamentais e não-governamentais com incidência no East London (como a Agência Ambiental, Natural England e Hidrovias Britânicas) buscassem atuar de forma conjunta, visando garantir ações coordenadas, mas sempre com uma postura crítica. Como fruto dessa atuação conjunta, deveria ser formulado um plano de futuro para o Lea Valley, de modo que a infraestrutura implantada dê resultados positivos em termos ambientais, sociais e econômicos para a cidade como um todo e para essa região em particular.
No último balanço trimestral, a Comissão também considerou que algumas recomendações feitas estavam sob risco de não serem cumpridas, tais como: viabilidade da compostagem de algumas embalagens desenvolvidas para serem utilizadas durante a competição, implementação adequada da estratégia de gestão de energia e plano de conservação visando a redução das emissões de carbono durante os jogos e compartilhamento, para além da "família do Comitê Olímpico Internacional", da aprendizagem derivada do legado de sustentabilidade de Londres-2012, de modo a que a indústria de eventos otimize, em outras competições no Reino Unido e em todo mundo, os recursos aplicados nos Jogos Olímpicos deste ano.
Saltos no plano de sustentabilidade -  De qualquer modo, a Comissão para uma Londres-2012 Sustentável considerou que foram verificados avanços em relação a outras Olimpíadas. Algumas áreas em destaque:




Área
Londres 2012
Pequim 2008
Atenas 2004
Sidney 2000
Mobilidade
Garantia de 100% de acesso aos jogos por transporte público, com melhorias significativas no transporte ferroviário e por ônibus
Cinco novas linhas de metrô, implantação do 4º e 5º  anéis viários.
Melhorias gerais no transporte público, incluindo eco-ônibus, nova linha de metrô, linha de trem e novo aeroporto internacional
Novas linhas para o parque.
Design inclusivo
Todos espaços projetados com os princípios do design inclusivo
Espaços concebidos com padrões contemporâneos
Sem informação
Requisitos para a inclusão observados em todos espaços
Criação de uma nova vizinhança ou revitalização da existente
Regeneração do Baixo Lea Valley no East London, que está no coração do projeto olímpico. Planos foram formulados para o futuro da área
Venda por atacado, visando novos usos, de grandes parcelas de terras no centro da cidade, com realocação de milhares de famílias no subúrbio  

Localização dos Jogos Olímpicos dependeu das terras existentes, não havendo estratégias de revitalização
Uma nova cidade foi planejada para 10 anos depois dos Jogos. A Vila Olímpica tornou-se um novo subúrbio
Infraestrutu-ra em energia renovável
Metas de energias renováveis  não cumpridas devido a falha técnica da proposta tecnológica para o território dos eventos. No entanto, medidas compensatórias foram tomadas no lugar e superadas
Compromisso de instalar rede  geotérmica de aquecimento para cobrir 16 milhões de metros quadrados. Vários locais equipados com energia geotérmica, fontes de água e ar provenientes de bombas de calor e sistemas de energia solar fotovoltaica
Sem energia solar fotovoltaica incorporada aos locais de encontro. Abordagem convencional de design em todos os locais. Sem medidas de economia de água
Vila Olímpica e alguns locais incluindo energia solar fotovoltaica. Medidas de economia de água, incluindo uma  estação de tratamento (WRAMS) que também fornece energia renovável
Redução de carbono
Meta de redução de 50% do carbono das operações na infraestrutura criada foi excedida, embora com medidas de compensação fora deste território
Impostos mais altos aplicados aos veículos maiores. 90% dos ônibus e 70% dos táxis usaram gás natural
Sem informação
Sem informação
Qualidade do ar
Meta de redução média de 30% dos congestiona-mentos através do aumento das caminhadas, ciclismo e do uso de transportes públicos
Fechamento de usina siderúrgica pesada na cidade, redução do número de veículos mais antigos nas estradas, restrições ao uso de veículos observadas nos Jogos estendidas em 12 meses após o evento
Campanha para aumento da consciência pública visando diminuir o número de carros
Sem metas específicas, mas o grande uso de transporte publicou reduziu o impacto do uso de veículos particulares
Metas em resíduos
Principal  compromisso de que os Jogos sejam um catalisador para a infra-estrutura de resíduos em East London  não será alcançada. Contudo, metas substanciais relativas aos resíduos foram observadas durante a fase de construção e durante os Jogos
Meta de que, em 2005,  96% de todos os resíduos e águas residuais  seriam eliminados de forma segura e tratados.
Sem atividades de reuso de material e reciclagem
90% dos materiais usados ou reciclados no próprio site. Política de embalagem para resíduos de alimentos
Materiais de construção
Varias metas definidas quanto ao uso de materiais ambientalmente sensíveis e de  reutilização de materiais em construção. As metas foram cumpridas
Não houve, mas foi feito um esforço relacionado ao uso de materiais em todas as fases de construção. Houve por exemplo um programa para eliminação progressiva dos gases que afetam a camada de ozônio e uso de materiais compostos de madeira para fabricação de mobiliário
Sem informação
Política de materiais ambientalmen-te sensíveis como PVC e madeira
Infraestrutu-ra de resíduos
Estação de tratamento de água residual que limpa e recicla água não potável foi construída no local
Meta declarada de construção de 14 novas estações de tratamento de águas residuais
Remediação de antigo aterro sanitário
Antigo aterro nivelado e equipado com captura de gás metano,  mas infra-estrutura não foi ativamente implantada
Plano de biodiversi-dade
Claro plano de ação em biodiversidade visando substituir a diversidade de espécies que foi perdida durante a construção e melhoria da biodiversidade no território
Criação de áreas verdes incluindo 680 hectares de parque e aumento do plantio de árvores incluindo 240 km de árvores e gramados
Houve propostas não executadas
Criação de novo parque
Metas de empregos locais
Metas específicas para emprego local foram superadas
Sem metas específicas
Sem consultas ou participação da comunidade
Forte estratégia de voluntariado
Criação de novas oportunida-des de negócios na área do legado
Planos de criar novas oportunidades de negócios por vários meios
Plano para tornar Pequim não apenas uma cidade produtora mas consumidora, com benefícios econômicos
Modestos impactos econômicos de longo prazo, embora infraestrutura tenha seus efeitos
Demora no estabelecimen-to de novo centro da cidade, mas economia cresceu por meio dos investimentos feitos
Resultados para a saúde em geral
Reiteração de metas de aumento da atividade física e participação em esportes durante sucessivos governos. Progressos nesta área não são animadores
Críticas a respeito de que muitos locais de esportes são caros para a população de Pequim
Sem metas propostas
Intenção declarada de melhorar  participação nos esportes a partir do efeito Olímpico, mas não houve monitoramento deste impacto

Fonte:  “Assegurando um legado - promessas, progresso e potencial”, da Comissão para uma Londres-2012 Sustentável, março de 2012, que citou, por sua vez, Gold JR & MR 2011 Olympic Cities Second Edition; Locate in Kent 2009 Economic Impacts of Olympic Games; Manidis Roberts 2010 The Legacy of the Green Games; East Thames nd 2012- Home Games; Greenpeace n.d The Beijing 2008 Environmental Performance Evaluation; UNEP 2008 UNEP Evaluation of Beijing 2008 Games. )
O propósito de renovação completa do Lea Valley, no East London, foi enfim alcançado, com a observação de muitos princípios da sustentabilidade e em função da governança estabelecida. Um dos principais pontos é que os Jogos Olímpicos e as Paraolimpíadas de 2012 em Londres são os primeiros da história olímpica a mapear a pegada de carbono, visando a redução de pelo menos 50% das emissões. A meta de geração de 20% da energia consumida no projeto olímpico por fontes renováveis não foi cumprida, porque não houve, ao contrário do esperado, aumento substancial da oferta de energias renováveis em Londres no período, mas foram aplicadas medidas para uso mais eficiente da energia.     
O fato de que mais de 80% do solo foram limpos e reutilizados no próprio território do parque olímpico indica a dimensão das operações, que incluiram o transporte de 2 mil toneladas de resíduos por barcaças. As fundações para o Centro Aquático, Arena de Handball e Estádio Olímpico usaram concreto com mais de 30% de material reciclado. Um viveiro do Reino Unido foi contratado para fornecer 60.000 plantas para o jardim do Parque Olímpico, localizado ao lado do Centro Aquático. No final de dezembro de 2010, havia 6500 pessoas trabalhando no Parque Olímpico e mais de 5300 na Vila Olímpica. Mais de 200 mulheres foram contratadas, o projeto envolveu mais de 400 aprendizes e 75% das pessoas anteriormente desempregadas e que foram contratadas eram provenientes de cinco distritos de East London.
O conceito geral de sustentabilidade observado foi construído com a parceria das organizações BioRegional e WWF. O relatório de sustentabilidade de Londres-2012 foi elaborado de acordo com os indicadores do GRI - Global Reporting Initiative. Este relatório, mais as conclusões da Comissão para uma Londres-2012 Sustentável, representam importantes subsídios para os próximos megaeventos esportivos - quatro deles a serem realizados no Brasil nos próximos quatro anos. (Por José Pedro S.Martins)    


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