sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Não faltou jogo para o futebol feminino: falta projeto de país



Por José Pedro Martins

O Brasil provavelmente levará o ouro no futebol masculino (embora ainda tenha que jogar muito para isso), mas de novo a nota triste é o descaso absoluto com o futebol feminino. Essas meninas são as nossas verdadeiras heroinas olímpicas. Sem nenhuma retaguarda, sem nenhum apoio, sem liga nacional, continuam correndo muito pelo país. É claro que uma hora ou outra não conseguiriam ficar entre as quatro melhores. Miopia, machismo descarado. Para o milionário futebol masculino, tudo, para o feminino, o sorriso amarelo de sempre. (E o mesmo pode ser dito em relação à maioria das outras modalidades) Com esse espírito olímpico (e o esporte em geral reflete os valores que um país cultiva), continuaremos lá na ponta oposta da tabela, e nem os jogos no Rio em 2016 irão salvar a casa.
Quando, em 1996, as meninas ficaram em quarto lugar nas Olimpíadas de Atlanta, deixando evidente o enorme potencial de avanços maiores, já deveria ter sido iniciado o tão falado e nunca praticado trabalho de base com o futebol feminino no Brasil. Qualquer país com ambição - e aqui a palavra é empregada no sentido mais positivo possível - olímpica, ou melhor, que efetivamente encara o esporte como plataforma para o desenvolvimento humano integral, faria isso.
Quatro anos depois, em Sydney, outro quarto lugar. Em 2004 e 2008, em Atenas e Pequim, a medalha de prata. Já era tempo de estruturação de um trabalho efetivo, a partir das escolas, como ocorre nos países que levam o esporte - e a educação - a sério, e isso nas mais diversas situações, dos Estados Unidos à Coreia do Sul, da China a Cuba.
Mas a esperança continuou apenas em função do talento individual, do brilho, de Marta ou Cristiane (o Brasil sempre dependendo de um líder...). Marta pouco jogou nos últimos dois anos. A liga americana, onde jogava, depois de anos na Europa, chegou a ser suspensa - o que não diminuiu o poderio do futebol feminino nos Estados Unidos, justamente porque lá existe o tal trabalho de base, a partir das escolas no primeiro ciclo.
Marta agora está falando em talvez não jogar as Olimpíadas de 2016. Ela provavelmente está amargurada e decepcionada com seu país. Deve ser muito difícil carregar a esperança de uma nação, mas não receber o retorno desejado desta mesma nação. Ela sabe muito bem a causa do fracasso em Londres.
Em "Lisístrata", Aristófanes descreve uma suposta greve do sexo - um ato biopolítico naquele contexto - entre as mulheres gregas, como forma de forçar a paz entre atenienses e espartanos, os precursores dos mágicos Jogos Olímpicos. Nos últimos tempos, greves e protestos tornaram-se comuns entre atletas de diferentes modalidades. Guardadas as devidas proporções históricas, e utilizando outros meios políticos, é claro, as meninas do futebol feminino talvez devessem pensar em um movimento firme para garantir o trabalho de base necessário para que o brilho retorne em 2016 no Rio de Janeiro - se é que ainda dá tempo. Não foram Marta, Cristiane e outras atletas que falharam. O que faltou, o que falta, é um projeto de Brasil.

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