sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Bolívia incorpora sugestões de povos indígenas a suas propostas para a Rio+20

O Abaporu, de Tarsila do Amaral, reproduzido em muro da EE Governador Mário Covas, em Monte Mor, é exemplo da influência da cultura indígena no Brasil e toda América Latina







Em seu documento oficial com propostas para a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20, a Bolívia é um dos únicos países a incorporar sugestões dos povos indígenas. A Bolívia tem 37 povos indígenas, enquanto o Brasil tem cerca de 220.

A visão diferenciada boliviana está ressaltada na própria apresentação do nome do país, o Estado Plurinacional da Bolívia, pois considera as nações indígenas ali existentes. E o documento para a Rio+20 é intitulado “Os Direitos da Natureza”, reiterando um conceito típico do olhar indígena sobre os desafios ambientais do planeta.
De início é indicado que o documento com as propostas oficiais da Bolívia tem como referências a Carta Mundial da Natureza (1982), a Declaração do Rio de Janeiro (1994), a Carta da Terra (2000) e a Conferência Mundial Popular sobre Mudança Climática e os Direitos da Mãe Terra (2010). Documentos e eventos não citados pela imensa maioria dos países que encaminharam suas propostas para a comissão coordenadora da Rio+20.
Segundo o documento, ao comentar um dos dos temas principais da Conferência, o desenvolvimento sustentável, é “ essencial reconhecer e afirmar que o crescimento tem limites. A busca da desenvolvimento sem fim em um planeta finito é insustentável e impossível. O limite para o desenvolvimento é definido pela capacidade regenerativa dos ciclos vitais da Terra. Quando o crescimento começa a quebrar esse equilíbrio, como podemos ver com o aquecimento global, não podemos mais falar dele como de desenvolvimento, mas, em vez disso, da deterioração e destruição de nossa casa”. Referência à Mãe Terra, como a proposta boliviana se refere ao planeta.
Sobre outro tema da Rio+20, a erradicação da pobreza, assinala a proposta boliviana: “ O principal desafio para a erradicação da pobreza não é crescer para sempre, mas para alcançar uma distribuição eqüitativa da riqueza que é possível sob os limites do sistema Terra. Em um mundo em que 1% da população controla 50% da riqueza do planeta, não será possível erradicar pobreza ou restaurar a harmonia com a natureza”. Uma posição claramente apontando para a necessidade de mudança dos padrões de acumulação de riqueza atualmente vigentes na maior parte do mundo.
Posição semelhante com o apelo: “Os chamados países "desenvolvidos" devem reduzir seus níveis de consumo excessivo e superexploração de recursos do mundo, a fim de restabelecer a harmonia entre os seres humanos e com a natureza, permitindo o desenvolvimento sustentável de todos os países em desenvolvimento”.
Entre as propostas, a de que a conferência reafirme “o direito humano à água, educação, saúde, comunicação, energia, transporte e saneamento”, como parte de serviços essencialmente públicos, e não privados. A segurança alimentar, o incentivo à produção por pequenos agricultores e indígenas, acesso à terra, água, sementes, crédito e outros recursos para a família e produtores da comunidade, o desenvolvimento de empresas públicas e sociais para produção de alimentos, distribuição e venda que impeçam a especulação.
Com relação às mudanças climáticas, a Bolívia defende a manutenção e fortalecimento do Protocolo de Kyoto, de modo que haja um segundo período de compromissos de controle de emissões pelos países desenvolvidos. O fim da violência contra as mulheres e o reconhecimento da dívida ecológica dos países desenvolvidos em relação aos países em desenvolvimento são outras posições bolivianas. A transferência de recursos financeiros provenientes de fontes públicas e de tecnologia para os países em desenvolvimento é um dos caminhos apontados.
A Bolívia igualmente defende a utilização dos bilionários recursos usados nos orçamentos militares para projetos voltados ao enfrentamento das mudanças climáticas. Um imposto sobre operações financeiras, voltado para formar um Fundo de Desenvolvimento, é outra proposta.
Para a Bolívia, a Rio+20 “não deve criar mecanismos de mercado” sobre o uso da biodiversidade, dos chamados serviços ambientais. O documento também assinala: “Direitos de propriedade intelectual sobre genes, microorganismos e outras formas de vida são uma ameaça à soberania alimentar, a biodiversidade, o acesso à medicina e outros elementos que são essenciais para a sobrevivência de populações de baixa renda”.
A Bolívia também defende novos indicadores para medir a riqueza, considerando os impactos sociais e ambientais, e um Tribunal Internacional de Justiça Ambiental e Climática. Em termos de governança, defende um Conselho para o Desenvolvimento Sustentável na esfera da ONU, que coordene as ações relacionadas aos pilares econômico, social e ambiental, e que seria criado a partir da atual Comissão para o Desenvolvimento Sustentável. Um Conselho que inclua mecanismos para garantir “a participação da sociedade civil e organizações não-governamentais, especialmente as organizações representativas dos trabalhadores, povos indígenas, agricultores, pequenos produtores agrícolas e pescadores, mulheres, jovens e os consumidores”.

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